O IBGE fechou a tríade de resultados de maio deste ano. Dados da indústria, varejo e serviços. Tivemos também os dados do IPCA. De maneira geral, a atividade vai bem, obrigado. Os grandes grupos da economia brasileira mostram-se em crescimento. Com exceção do grupo de serviços, que dá sinais de estafa, veículos, varejo, indústria e construção encontram-se no quadrante de crescimento em maio de 2024.
Mas tem uma conta que não “fecha”. Sou um aficionado em dados. As análises disponíveis são, normalmente rasas. Dados gerais limitam a visão. Além de desdobrar, é preciso rearranjar e tentar enxergar outras correlações e fugir da causalidade. Nas minhas mentorias para empresários do setor do plástico e de embalagens, crio a cultura de desmembramento dos dados, mudar o foco. Fazer perguntas que poucos estão fazendo. Aprendemos onde encontrar os dados, como trazer os dados para outras plataformas, como tratar estes dados que não o excel (perdão a quem gosta, ele já foi útil, mas hoje temos coisa muito melhor). E, recentemente, impulsionamos com agentes de IA. Vamos ao que interessa:
O curioso caso da Renda e o Endividamento
Primeiramente, quero trazer aqui uma provocação. O intuito é sempre projetar o cenário à frente. Nunca use dados atrasados para projetar o cenário, a chance de errar é enorme. Acompanhe a variação da renda real média do brasileiro. Repare como a renda real começou a subir a partir do início de 2022 (causas já comentadas em outros artigos).
Compare agora com o aumento percentual da população adulta negativada no SERASA. O SERASA considera os inadimplentes pessoas adultas com, pelo menos, algum débito não honrado.
Há algum tempo, o brasileiro se importava em “limpar” seu nome. Repare como os auxílios emergenciais ajudaram a retirar uma parcela da população da lista do SERASA. No gráfico também é possível ver o fracasso do programa Desenrola. Mas, curiosamente, a partir de janeiro de 2022 o percentual de devedores começou a subir freneticamente, o programa do governo federal causou, no máximo, um soluço na tendência.
Olhando o problema geograficamente, podemos perceber estados com situação mais complicada na inadimplência da pessoa física. Amazonas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amapá, Rio de Janeiro e o Distrito Federal têm mais de 50% da população adulta com débitos não honrados.
Mas, como estavam os estados em janeiro de 2022 e como a situação mudou de lá para cá? O estado do Ceará e do Rio de Janeiro lideram a escalada de inadimplentes. Apenas o Espírito Santo e o Acre apresentaram redução do percentual de inadimplentes. O Amazonas é o único que permaneceu estável. Fica ainda a dúvida sobre a nova situação em que o Rio Grande do Sul pode apresentar a partir dos dados de maio/24 por conta da tragédia.
Outra pergunta, de quanto estamos falando? Qual é o montante de capital envolvido nestas dívidas não honradas? Segundo o SERASA, em abril deste ano, a soma de capital das dívidas está na ordem de R$ 394 bilhões. É isso mesmo, bilhões. São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul representam quase 61% deste montante. São Paulo, sozinho, representa 26%.
Sabemos que, boa parte destas dívidas incluem juros exorbitantes cobrados pelas instituições. Entretanto, me parece que há um problema central não discutido pela maioria. Dívida negativada é dívida não paga. O brasileiro parece ter saído do modo “pago quando puder” para o modo “simplesmente não pago”. Provavelmente, estas dívidas começaram a disputar lugar com gastos em necessidades básicas, como alimentos e farmacêuticos, por exemplo. Se parte deste dinheiro não foi para instituições, provavelmente foi parar no varejo. Curiosamente, os setores varejistas de maior destaque desde janeiro de 2022 é o de supermercados e de farmacêuticos.
Este crescimento no consumo está atrelado simplesmente ao aumento de renda? Por qual motivo o brasileiro está negligenciando estas dívidas mesmo com ganhos maiores e menor desemprego? Temos um elefante na sala completamente ignorado.