15 Semanas. É tempo suficiente para montar uma estratégia, pelo menos, penso assim. O mercado de embalagens é um dos melhores indicadores da dinâmica de consumo do varejo de não duráveis. O mercado de alimentos, então, antecipa muitos movimentos.
Qual o motivo de eu ter dito 15 semanas? É o tempo que se passou desde minha desconfiança de que o mercado de embalagens flexíveis pudesse estar prestes a enfrentar um novo choque de oferta. Recomendo a leitura do artigo presente no linkedin clicando aqui.
A lógica é simples, os players precisam se antecipar ao consumo no intuito de atender as expectativas de demanda. Para que um alimento chegue embalado nas gôndolas de supermercados existe um tempo precioso que boa parte de pessoas do mercado financeiro nem imaginam que exista.
O fabricante de alimentos precisa prever uma demanda de consumo, emitir o pedido para a indústria de conversão (fabricantes de embalagens). A conversão precisa solicitar o pedido dos insumos necessários (filmes, tintas, adesivos, etc.) aos fabricantes. O processo de fabricação de embalagens exige etapas sucessivas como impressão, laminação, cura, entre outros. Podemos por facilmente um delay de 3 meses até o processo estar completo.
Por incrível que pareça, com exceção de grandes e organizados players, este mercado não trabalha com a logística moderna. Médias e pequenas empresas raramente têm contratos de fornecimento e trabalham com demanda puxada. É comum, em períodos de choques de oferta ou demanda, ocorrerem sérios desbalanços de atendimento e perdas financeiras consideráveis.
Sempre desconfie de alguém que traça cenários sem nunca ter pisado num chão de fábrica. Dados de varejo e indústria, por serem atrasados, devem ser utilizados para confirmação de cenário e nunca como auxiliares em previsões.
Vamos ao exemplo do BOPP. Se você não é familiarizado com o mercado de embalagens, BOPP é a sigla para filme de Polipropileno Biorientado. Em termos de volume pode ser considerado um dos principais filmes utilizados para embalagens de alimentos industrializados. Perceba no gráfico abaixo o volume acumulado de importação de BOPP, até junho, dos últimos cinco anos. Não se iluda com 2021, a disrupção da cadeia no fim de 2020 por conta da COVID fez pedidos que deveriam chegar ainda em 2020 chegarem apenas no primeiro trimestre de 2021. Mesmo assim, os números de 2024 ultrapassam a grande euforia do consumo da pandemia.
Mas você pode estar se perguntando: Como está a exportação? Talvez tenha crescido também e mantido o mercado regulado. Em se tratando de BOPP, normalmente, o volume exportado no Brasil é maior que o importado. Este ano tivemos uma inversão no acumulado de 12 meses, segundo os dados da COMEX. Portanto, a resposta é não. O que observamos é um aumento substancial na oferta interna de BOPP.
No caso do BOPET, a situação é ainda mais impressionante. Mais importante do que o valor em si, o acumulado de 12 meses escancara a tendência do movimento. No caso do BOPET, o ímpeto de importação permanece alto e a exportação enfraquecida. Quanto maior a distância dos índices acumulados, maior a percepção de oferta no mercado.
Certo, mas o que está por trás deste movimento atípico de 2024? Voltemos aos fundamentos. Aumento de consumo de gôndola está atrelado a ganhos reais de renda (acima da inflação) e queda no desemprego. Ambas estão ocorrendo desde 2022. O gráfico abaixo mostra uma correlação interessante entre a variação real de renda e os movimentos de importação de BOPP. Perceba como o mercado é atrasado às mudanças de ciclos. A percepção de melhora ou piora de demanda leva, em média, seis meses. Neste período temos um rearranjo de percepções até que os players entendam o movimento. Muito dinheiro fica “na mesa”, é o custo da falta de integração logística. O bom e velho “cada um por si”.
O desafio do desenhista de cenário é encontrar as próximas peças do quebra-cabeça. Se simplificarmos o consumo atrelando-o a emprego e renda, já podemos desenhar um esboço.
Detalhe: há mais variáveis que interferem no consumo de supermercados como o estudo da inflação de certos grupos de alimentos, o grau de endividamento por níveis de faixas de renda, câmbio, entre outros. Vou me ater a estas duas variáveis por questão de simplificação.
A primeira coisa que salta aos olhos é o ímpeto da importação. O coeficiente angular do movimento mostra-se, aparentemente, distante de reverter a tendência.
Graficamente, já é possível notar um certo cansaço no ganho real da renda média do brasileiro. Mesmo que haja dúvidas, pense que não teremos ajustes de salários até o fim do ano e a volatilidade do câmbio deve trazer impactos, mesmo que tardios, ao custo de vida do brasileiro. Além disso, a inflação de alimentos permanece pressionando o bolso do cidadão.
E quanto à geração de empregos? Vamos recorrer ao acumulado de vagas criadas no mercado formal. Segundo o Ministério do Trabalho, até maio de 2024, o Brasil gerou um saldo de 1,68 milhões de vagas, o que é ótimo. Entretanto, é possível notar que este é um ritmo difícil de ser mantido. Não que seja impossível.
A atividade de hipermercados e supermercados também pode ser acompanhada por dados do varejo. A Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) divulgada pelo IBGE nos ajuda a entender os movimentos cíclicos de boa parte das atividades varejistas.
Voltando aos fundamentos, novamente. A economia se move em ciclos, crescimento, estafa, retração e recuperação fazem parte da normalidade. Para o consumo de supermercados, entramos no quadrante de crescimento desde setembro de 2022, completaremos 2 anos em breve neste ritmo. Por quanto tempo mais é possível permanecer neste ritmo?
Minha opinião: há sinais de desgaste de movimento. O problema é que estamos para entrar no trimestre considerado áureo para o mercado de embalagens. Setembro e outubro são aguardados ansiosamente pela indústria. Como comerciantes praianos nos meses de verão, nos abastecemos e aguardamos pela crescente demanda para aplicarmos margens gordas nos altos volumes vendidos, e assim, salvamos o resultado do ano. É um mantra, quase um verso bíblico.
Não que a demanda esperada seja ruim, porém, o excesso de oferta pode transformar o mercado num “saldão” de descontos. Se fossemos comerciantes praianos, é como se chovesse durante todo o período da temporada de verão.